sexta-feira, 21 de setembro de 2018

Carta ao Povo de Deus sobre as eleições 2018

Dom André Witte, bispo da Diocese de Ruy Barbosa, na Bahia, lança uma Carta Pastoral, clara e profética, sobre as eleições 2018. 
CARTA AO POVO DE DEUS SOBRE AS ELEIÇÕES 2018
“Ai daqueles que fazem leis injustas, que escrevem decretos opressores para privar os pobres dos seus direitos e da justiça” (Isaías 10, 1)
Caros irmãos e irmãs,
O ano eleitoral representa um especial desafio à nossa rede de comunidades. A esse desafio, a Igreja nos convida a dar respostas à luz da nossa fé cristã. Cada pessoa é convidada a exercer o seu direito e a cumprir o dever de dar o seu voto consciente. A Igreja não se sobrepõe à consciência de nenhuma pessoa, mas oferece critérios para o necessário discernimento nesse ano eleitoral.
A CNBB publicou vários documentos sobre o ano eleitoral. Entre eles destacamos a CARTA DO FÓRUM NACIONAL DAS PASTORAIS SOCIAIS, SETOR DA MOBILIDADE HUMANA E ORGANISMOS e a Mensagem da CNBB para 07 de setembro: A FORÇA TRANSFORMADORA DE UM POVO.
Com base nesses documentos, trazemos aqui algumas orientações para um bom exercício da cidadania, à luz da Doutrina Social da Igreja:
1- Não votar nos deputados federais e senadores que foram a favor da PEC da Morte (congelamento por 20 anos dos investimentos em políticas públicas, Emenda Constitucional nº 95/2016), à Terceirização e à Reforma Trabalhista.
2- Não votar em candidatos que ataquem os Direitos Humanos e defendam o “uso das armas” como solução para os problemas sociais. Que não defendam os valores da vida desde a fecundação até a morte natural, da família conforme o projeto de Deus, da liberdade religiosa, do respeito, da saúde, da educação, da moradia e da preservação do meio ambiente.
3- Apoiar candidaturas que tenham uma trajetória de compromisso com as lutas por direitos do povo, propostas que apontem para a inclusão social das pessoas mais vulneráveis, pobres e excluídas; priorizem a defesa da vida humana, em todas as suas etapas, e da mãe-natureza; lutem pela igualdade de direitos entre homens e mulheres; defendam os direitos humanos, principalmente das crianças, dos adolescentes, dos jovens, das pessoas idosas e dos encarcerados; lutem pelo reconhecimento dos territórios dos Povos Indígenas, quilombolas, ciganos e
comunidades tradicionais; tenham compromisso com a Reforma Agrária, habitação popular e com os direitos dos trabalhadores e trabalhadoras.
4- Conhecer as propostas dos partidos e verificar se correspondem à visão de bem comum coerente com os valores do Evangelho.
5- Verificar se os candidatos têm clareza acerca do cargo que ocuparão e de suas funções.
6- Verificar se os candidatos estão mais preocupados com um bom marketing de sua imagem na campanha ou em apresentar propostas realistas para os grandes problemas sociais do país.
Nas eleições de outubro, devemos avaliar com seriedade cada candidato, cada candidata, suas promessas, sua campanha, as alianças de seu partido e sua atuação política passada.
“O bem maior do País, para além das ideologias e interesses particulares, deve conduzir a consciência e o coração tanto de candidatos, quanto de eleitores” (CNBB, Eleições 2018: Compromisso e Esperança). Precisamos ter cuidado na escolha dos senadores e deputados, que constituem o Poder Legislativo. No Congresso Nacional e nas Assembleias Legislativas é que se votam as leis que podem ajudar ou prejudicar o povo. Anular o voto ou votar em branco favorece o pior político, enfraquece a democracia e põe em risco a oportunidade de purificar a política. A cidadania, no entanto, não se esgota no voto. É preciso continuar acompanhando os eleitos, cobrando-lhes o cumprimento de seu dever de servir o povo, através de conselhos municipais e fóruns de cidadania, entre outros.
O Papa Francisco afirma:
“Envolver-se na política é uma obrigação para um cristão. Nós, cristãos, não podemos nos fazer de Pilatos e lavar as mãos. Não podemos! Devemos nos envolver na política porque a política é uma das formas mais elevadas da caridade, porque ela procura o bem comum. ”
Que Santo Antônio e nossa Mãe Aparecida intercedam junto à Trindade Santa, pelo povo brasileiro, para que possamos resgatar a democracia, vencer a tentação da intolerância e dialogar sempre para anunciar o Reino de Deus, sendo “sal da terra e luz do mundo”.
CONSELHO DIOCESANO DE PASTORAL
DOM ANDRÉ DE WITTE
Bispo Diocesano

terça-feira, 4 de setembro de 2018

Mineradora norueguesa Yara ignora impactos em Cruzeiro da Fortaleza (MG)

Neste dia 03 de setembro de 2018 aconteceu uma Audiência pública na cidade de Cruzeiro da Fortaleza*, MG, no plenário da Câmara Municipal com a presença do Prefeito Municipal Sr. Agnaldo Ferreira da Silva, vereadores locais, membros da sociedade civil e representantes da empresa multinacional norueguesa Yara Brasil Mineração. O objetivo foi o de avaliar os impactos sócio-ambientais que ocorrerão com a entrada em operação do Complexo Mineroindustrial de Serra do Salitre, dedicado à mineração, beneficiamento de rocha fosfática e produção de fertilizantes, limítrofe a Cruzeiro da Fortaleza. Inicialmente esse empreendimento era sob o nome da mineradora Galvani. Desde 2014, a Galvani foi integrada à norueguesa Yara, que  adquiriu 60% de suas ações.

Empresa ignora munícipio de Cruzeiro da Fortaleza

A pauta principal da audiência foi o fato do município de Cruzeiro da Fortaleza não ter sido contemplado nos estudos de impacto ambiental do empreendimento.  O município será diretamente afetado pela operação da mineradora em diferentes condições, principalmente pelo fato do abastecimento público local ser proveniente do curso d’água advindos da barragem de rejeito.

Foram feitas apreciações pela Empresa Yara com relação ao processo de licenciamento ambiental o qual foi submetido à empresa e os tramites até a emissão das licenças de instalação. Contudo, ficou clara a ausência do município de Cruzeiro da Fortaleza nos Estudos da empresa, analisando como se não houvesse nenhum dano condicionado ao município e comunidades locais

Comunidade Quilombola

Um dos aspectos que mais chamou atenção, é o do completo descaso, da multinacional Yara, em relação à existencia de comunidade Quilombola, que foi totalmente ignorada. Em flagrante desrespeito à Convenção 169 da Organização Internacional do Trabalho (OIT) da qual o Brasil é signitário. 

A Conveção 169 da OIT assegura o direito à consulta prévia das comunidades tradicionais atingidas por projetos públicos e privados, bem como por quaisquer medidas legislativa ou administrativa que os afete. Os protocolos informam como as comunidades devem ser consultadas. A existência dessa convenção é extremamente importante, para garantir direitos e vitar impactos nocivos ao meio ambiente, nos territórios dessas comunidades.

A consulta exigida pela OIT prevê um processo de troca de informações entre as partes, antes que qualquer decisão sobre o projeto seja tomada, inclusive ainda em sua fase de concepção. A consulta e os estudos participativos fazem parte de um diálogo necessário sobre justiça, que deve ser mantido ao longo do processo.

Questão hídrica 

A exposição do problema contou com a participação dos Vereadores, ONG’s, Academia, Líderes Quilombolas, membros de Associações e comunidade local, denunciando os problemas relacionados ao risco hídrico, prejuízos quanto à qualidade ambiental e interferências na economia local, bem como a falta de segurança quanto a barragem de rejeito. A população se mostrou bastante preocupada com os danos relacionados ao projeto de mineração e denuncia a ausência de medidas preventivas por parte da empresa que aborde as áreas a jusante do empreendimento. 

Preocupa a falta de estudos em relação às consequencias relativas a rebaixamento de lençol freático, devido ao processo de extração, bem como a probabilidade de secar nascentes, como ocorre em vários empreendimentos minerários similares.

A denuncia se estendeu pela ocorrência já registrada da presença de sedimentos (lama) na água do Ribeirão Fortaleza, principalmente por aqueles proprietários localizados próximo a barragem. Outro aspecto muito ressaltado pelos presentes na audiência se trata ao completo desconhecimento da população em relação à plano de Segurança, em caso de ruptura da barragem. Nesse caso específico, nunca foi mostrado o Plano em relação a rompimento (Análise de "Dam Breake"). 

Nesta audiência, simplesmente, a empresa, depois de ser questionada, informou que no caso de uma ruptura da barragem, cerca de mais de 80 propriedades seriam atingidas, a jusante da barragem, mas que ainda segundo a empresa não causaria danos. Os presentes na audiência exigem conhecer tudo sobre essa questão, quais propriedades seriam atingidas e o que a empresa tem planjado e feito em termos de obras de contenção de engenharia, para evitar danos. 

Comunidade se organiza

Essa audiência expos um fato rotineiro no Brasil, o da implantação de grandes empreendimentos sem consideração dos devidos fatores de impacto e que, somente posteriormente a liberação das licenças começam a ser reconhecidos. A comunidade local mostrou seu interesse e preocupação frente aos impactos que acomete a região, vendo o risco de terem suas atividades impactadas tanto pela escassez das águas, quanto pela qualidade por contaminação de sedimentos presentes nos rios, que poderá isso acarretar em prejuízos econômicos, sociais, ambientais e culturais da região.

Mais uma vez se comprova o descaso e desrepeito de empresas mineradoras em relação aos territórios e suas populações. Fica claro que eles querem a invisibildade para agirem na irresponsabilidade.


*O município de Cruzeiro da Fortaleza está situado na região do Alto Paranaíba, no estado de Minas Gerais, com quase 5 mil habitantes e tem como principais atividades econômicas a bovinocultura de leite e corte, como também agricultura de milho, café e soja.

domingo, 2 de setembro de 2018

Luto - Memoria incinerada


Uma tragédia sem precedentes é o incêndio no Museu Nacional na Quinta da Boa Vista, no Rio de Janeiro. Seu presente de 200 anos foram cortes orçamentários que levaram à completa destruição de 20 milhões de peças. O museu mais antigo do país, onde funcionou a sede da Monarquia, foi abaixo pela irresponsabilidade de como as autoridades vêm tratando a memória histórica e o conhecimento. Perdemos um acervo histórico, arqueológico, antropológico, etnográfico e de História Natural respeitável internacionalmente. Tínhamos a maior coleção egípcia da América Latina, com múmias intactas dentro de seus sarcófagos. Acervo africano, americano pré-colombiano, grego, mediterrâneo, do Brasil pré-histórico e fósseis até mesmo da mais antiga brasileira já encontrada: Luzia, com 11.500 anos. Havia ainda animais desde a explosão cambriana, dinossauros, a megafauna do pleistoceno, como a preguiça gigante e até mesmo milhares de borboletas. Perdemos uma biblioteca insubstituível, com obras raríssimas como os livros da expedição de Napoleão no Egito e o diário de viagem de Dom Pedro II às pirâmides e a Luxor. Pesquisas em andamento viraram pó. A memória e a ciência brasileira e mundial estão em luto. Uma dor irreparável! Que nestas eleições, haja um compromisso dos políticos com a memória, a história e a ciência. Minha solidariedade a todos os trabalhadores e pesquisadores.

Prof. Thomas de Toledo, doutorando em Arqueologia pelo MAE/USP