sábado, 19 de dezembro de 2020

Nota Regional Leste 2 CNBB - MAIS UM TRABALHADOR DA VALE MORRE SOTERRADO


Morreu soterrado, na sexta  feira (18), o trabalhador da Vale, Julio Cesar de Oliveira Cordeiro, enquanto trabalhava na Mina do Córrego do Feijão, em Brumadinho, Minas Gerais. Leia a nota do Grupo de Trabalho de Ecologia Integral e Mineração, do Regional Leste 2 CNBB e outras entidades exigindo do sistema de justiça, urgente apuração sobre as circunstâncias e local do óbito do trabalhador.

MAIS UM TRABALHADOR DA VALE MORRE SOTERRADO

O Grupo de Trabalho de Ecologia Integral e Mineração, do Regional Leste 2 da Conferência dos Bispos do Brasil e as entidades abaixo assinadas exigem do sistema de justiça, urgente apuração sobre as circunstâncias e local do óbito do trabalhador terceirizado da VALE S/A, JÚLIO CÉSAR DE OLIVEIRA CORDEIRO.

A cava estava sendo usada para disposição dos rejeitos do rompimento de 25/01/2019, depois que uma Licença Ambiental Simplificada (LAS/RAS), a mais simples das modalidades de licença, foi concedida há quase um ano, em 27/12/2019 por Rodrigo Ribas, Superintendente de Projetos Prioritários (SUPPRI). Tal fato surpreendeu muito na ocasião.

No Auto de Fiscalização 52353/2020 do dia 4 deste mês, que está no processo de licenciamento SLA 426/2020, constam informações sobre essa atividade:

[...] B) Na data da fiscalização o sistema estava paralisado por determinação da ANM. Foi informado que estão sendo tomadas algumas medidas de segurança para que as atividades retornem. O ponto 1, localizado na cota más próxima do N.A. (Nível de água) será feita uma redução da inclinação das vias de acesso, para evitar um possível acidente provocado por inclinação a qual provocaria um aumento da velocidade do veículo. Nos pontos 3 e 4 serão instalados sistemas de controle que impedirão o basculamento dos veículos em áreas de risco, ou zonas quentes. O ponto 2 está interditado até novas averiguações. C) A face norte da cava está em constante monitoramento por radar 24 horas por dia. D) Os trabalhos de disposição de rejeitos serão na face sul, que segundo informado apresenta mais segurança geológica e operacional. E) A operação de disposição de rejeito se dará com basculamento do material dentro de uma faixa de segurança com posterior arraste através de equipamentos de menor porte. Ainda foi informado que em cerca de 60 dias ocorrerá este serviço de movimentação de material, através de equipamentos de operação remota, sem presença, digo, sem operador dentro do equipamento. F) Foi informado que ocorrerá uma limitação da entrada de pessoas e equipamentos dentro da cava, para disposição de rejeitos. [...] Será determinado ao empreendimento que todas as ações referentes à segurança da cava de Feijão deverão ser encaminhadas para o órgão ambiental, na FEAM e para a Supram CM através do SEI.

Assim, fica claro que a atividade de disposição de rejeitos na cava tinha situações que envolviam riscos à segurança. Por isso, é necessário saber qual a relação entre o serviço que Júlio Cesar estava fazendo com a retroescavadeira nos taludes da cava e a atividade de disposição de rejeitos. E também saber se já havia histórico, e desde quando, de situações de deslizamentos ou instabilidade nos taludes da cava da mina de Córrego do Feijão. Porque se tiveram início após a movimentação de maquinas para disposição de rejeitos na cava isso precisa ser objeto inclusive de averiguação já que sinalizam que não houve por parte da Vale os devidos estudos sobre essa atividade licenciada como LAS/RAS pela SUPPRI.

Importante ressaltar que o Parecer Único da SUPRI apontou questões sobre o risco às cavidades, mas nada sobre o risco da disposição de rejeitos na cava, com a movimentação de maquinários com trabalhadores.

Conforme disposto no Parecer Único no 002/2019 - Vale S/A - Mina Córrego do Feijão (10267672) - SEI 1370.01.0022773/2019-94 / pg. 4, demonstrou que o local cujas obras foram realizadas na borda da cava, sob um talude , já era do conhecimento dos riscos por, “(...) ter identificada estar em área de muito alto grau de potencialidade de ocorrência de cavidades, e o relatório apresentado indicar a existência de cavidades na área do empreendimento ou em seu entorno numa faixa de 250 metros (...)”, podemos concluir que poderia incidir também, na mesma área, um alto grau de riscos de deslizamento, fato descrito com clareza no relatório em referencia, veja:

Apesar de a análise da Área Diretamente Afetada ADA deste empreendimento e os critérios locacionais de enquadramento da tabela 4 da DN COPAM 217/2018 conforme camadas e dados da Infraestrutura de Dados Espaciais do Sistema Estadual de Meio Ambiente e Recursos Hídricos IDE SISEMA, ter identificada estar em área de muito alto grau de potencialidade de ocorrência de cavidades, e o relatório apresentado indicar a existência de cavidades na área do empreendimento ou em seu entorno numa faixa de 250 metros, informa também que não haverá impacto nessas cavidades, com apresentação de laudo de análise que conclui que:

“... o projeto de disposição de rejeitos no interior da cava do Feijão, em relação as cavidades MJ_0009 e MJ_0010 e sua área de influência, não são previstos impactos diretos ou indiretos, estando o entorno (buffer de 250m) e a área de influência fora do alcance do local pretendido. A análise de impactos... desenvolveu um plano de monitoramento aprovado pela SUPPRI e que encontra-se em andamento.”

Bem, sobre o relatório aludido, aprovado pelo Governo do Estado via SUPRI, há, no nosso entender, contradição no momento em que, a um só tempo, identifica incidir sob a área ocorrência de cavidades e afirmar que não seriam previsíveis impactos diretos ou indiretos sobre estas. Da afirmação da SUPRI destaca-se que sob a área é de muito alto grau de potencialidade de ocorrência de cavidades, e o relatório apresentado indicar a existência de cavidades na área do empreendimento ou em seu entorno numa faixa de 250 metros, informa também que não haverá impacto nessas cavidades,(...)”.

Reiteramos novamente que as circunstâncias e local do óbito do trabalhador terceirizado da VALE S/A, JÚLIO CÉSAR DE OLIVEIRA CORDEIRO devem ser devidamente apuradas pelo sistema de justiça, porque a cava da mina Córrego do Feijão não estava sem atividade, como algumas matérias na imprensa veicularam. 

Belo Horizonte, 19 de dezembro de 2020

Grupo de Trabalho de Ecologia Integral e Mineração – Regional Leste 2 / CNBB
Região Episcopal Nossa Senhora do Rosário / Arquidiocese de Belo Horizonte
Rede Igrejas e Mineração
CARITAS
Comissão Pastoral da Terra
Conselho Indigenista Missionário
Conselho Pastoral dos Pescadores
Movimento pelas Serras e Águas de Minas








quarta-feira, 9 de dezembro de 2020

CNBB denuncia novamente a falta de participação dos atingidos no processo do acordo Vale e Governo de Minas


A CNBB protocolou, nesta quarta-feira (09), um documento (leia o documento) em que faz apelo aos órgãos do Estado para que tenham transparência em qualquer tipo de negociação e que garantam a justiça junto às pessoas atingidas e ao meio ambiente, reiterando a necessidade de participação dos atingidos em todo e qualquer processo referente à reparação e/ou compensação. Esse documento foi enviado ao Presidente e ao 3º Vicente Presidente do TJMG, bem como para o Juíz da 2a Vara da Fazenda Pública Estadual de da Comarca de Belo Horizonte, para o MPE, Advogado Geral do Estado e  o Coordenador do CEJUSC 2º Grau.

A Comissão Especial de Ecologia Integral e Mineração da CNBB, a Região Episcopal Nossa Senhora do Rosário, o Grupo de Trabalho de Ecologia Integral e Mineração do Regional Leste II da CNBB e a Rede Igrejas de Mineração, nesse documento relatam sobre a não participação das comunidades atingidas na construção do acordo entre Vale e o Governo de Minas Gerais. As questões apontadas foram baseadas em uma rodada de escuta e diálogo com os atingidos da região de Brumadinho.

No dia 13 de novembro, a CNBB protocolou na 2a Vara da Fazenda Pública Estadual de da Comarca de Belo Horizonte, documento questionando a construção do acordo, a partir da minuta que a imprensa teve acesso. Na ocasião, contestou uma série de condutas, como a não participação da população atingida, a “gestão paralela” do Estado na administração dos recursos, a exclusividade do Ministério Público Estadual nas indicações das auditorias e outras questões, que como apontado pelo documento, desrespeitam a legislação brasileira e violam os direitos das populações atingidas.

Como resposta, a CNBB foi notificada no dia 16 de novembro, que as comunidades atingidas estavam participando do processo através das instituições de justiça. A partir disso, foi criada uma comissão para a realização de rodas de escuta e diálogo com os atingidos da região de Brumadinho. Durante as reuniões, foi constatado a ausência de consulta a essas comunidades e total desconhecimento sobre o conteúdo do acordo em questão.

"As audiências estão acontecendo, mas as comunidades não estão fazendo parte. Pelo menos algum representante das comunidades tinha que estar junto e por dentro do que está sendo combinado. Se for algo contrário, não temos nem tempo de responder sobre nossos direitos. Estamos sem saber o que está por trás dessa negociação", relatou Matuzinha de Fátima, da comunidade quilombola do Sapé, de Brumadinho, para a equipe da Arquidiocese de Belo Horizonte. As comunidades quilombolas, inclusive, lembraram o Protocolo de Consulta Prévia, Livre e Informada, elaborado junto à SEDESE/MG, como importante instrumento de participação e que não pode ser deixado de lado.

A CNBB através das entidades signitárias do documento, a partir de reuniões e consultas às comunidades atingidas contesta e denuncia novamente a falta de transparência e participação dos atingidos no processo do acordo Vale e Governo de Minas.