quarta-feira, 6 de dezembro de 2023

CPT - Projeto de Lei do Polo Minerario de Lítio nos Vales do Jequitinhonha e Mucuri


Na Assembleia Legislativa do Estado de Minas Gerais, tramita o Projeto de Lei nº 1.992/2020, de autoria do Deputado Estadual Doutor Jean Freire – PT, que propõe a criação do Polo Minerario e Industrial do Lítio nos Vales do Jequitinhonha e Mucuri, que envolve 14 municípios (Araçuaí, Capelinha, Coronel Murta, Itaobim, Itinga, Malacacheta, Medina, Minas Novas, Pedra Azul, Rubelita, Salinas, Virgem da Lapa, Teófilo Otoni e Turmalina) da região Nordeste do Estado.

Expressamos nossa preocupação e indignação em relação a este projeto de lei, pois não houve a consulta de toda a população que será diretamente impactada. Em Julho de 2022, durante Audiência da Comissão dos Direitos da Mulher da ALMG, foram feitas diversas denúncias sobre a falta de água em toda a região do Jequitinhonha e Mucuri, sabemos que esses empreendimentos secam nascentes, trazem consigo poluição e assoreamento de cursos d’água, além do uso abusivo de água, gerando ainda mais conflitos nos territórios.

Apesar da retomada de políticas públicas importantes para combater a violência no campo, os dados do 1º semestre de 2023 dos registros de Conflitos no Campo Brasil, a Comissão Pastoral da Terra registrou 973 conflitos, representando um aumento de 8% em relação ao mesmo período de 2022, sendo o segundo maior registro em uma década.

Somos contrários a qualquer iniciativa que promova a criação, fortalecimento e incentivo da cadeia de exploração da mineração. Os eventos de Mariana (2015) e Brumadinho (2019) evidenciam que a atividade minerária ameaça o meio ambiente e a existência de grupos em situação de vulnerabilidade social, muitas vezes já criminalizados pelos interesses do grande capital. A ausência de Consulta Livre, Prévia e Informada dos povos indígenas, quilombolas, pescadores, povos e comunidades tradicionais, assentados e assentadas da reforma agrária dos vales Jequitinhonha e Mucuri caracteriza uma ilegalidade em todo o processo de licenciamento ambiental, considerando que o Brasil é signatário da Convenção nº 169 da Organização Internacional do Trabalho (OIT).

O desenvolvimentismo adotado por governos no Brasil reforça uma lógica conservadora e colonial, estruturada em um modelo econômico e social que busca criar uma falsa percepção de bem-estar social e equilíbrio ambiental. A estrangeirização das terras e também as isenções fiscais, como a que consta no Art. 3º, VII do PL 1992/2020, são ferramentas desse modelo, que amplia a acumulação de capital, destrói territórios e ameaça povos e comunidades tradicionais que lutam para sobreviver diante desse sistema.

Concordar com a lógica do mercado, que coloca o lucro como fim em si mesmo, não faz sentido para a existência humana. Seja em uma visão antropocêntrica, que enfatiza a importância de garantir a perpetuação dos povos, ou em uma perspectiva que reconhece que tudo no universo, na terra, incluindo a natureza e a humanidade, é parte de uma criação divina que deve ser cuidada e respeitada.

Os recursos naturais necessários para a tecnologia, como o lítio, o silício e tantos outros não são certamente ilimitados, mas o problema maior é a ideologia que está na base duma obsessão: aumentar para além de toda a imaginação o poder do homem, para o qual a realidade não humana é um mero recurso ao seu serviço. Tudo o que existe deixa de ser uma dádiva que se deve apreciar, valorizar e cuidar, para se tornar um escravo, uma vítima de todo e qualquer capricho da mente humana e das suas capacidades.” (Papa Francisco – Laudato Deum)

Enquanto a mineração for motivada pela ganância e lucro das grandes empresas, ameaçando e impactando as comunidades camponesas, os povos e as comunidades tradicionais, os povos originários, os assentamentos da reforma agrária, a Comissão Pastoral da Terra (CPT-MG) continuará se opondo a esse modelo de desenvolvimento que alimenta a violência, os conflitos no campo e promove injustiças sociais e destruição ambiental.

Os Vales são do Jequitinhonha e do Mucuri! Nomes de origem indígena e que remetem respectivamente a um “Rio largo cheio de peixes” e a uma árvore que é nativa desta região, conhecida por ter uma madeira resistente e rajada, são símbolos da resistência dos povos que por lá habitam há séculos e lutam pela defesa dos territórios.

Não à Mineração!
Sim a Vida e a Dignidade Humana!

Belo Horizonte-MG, 06 de Dezembro de 2023.
Comissão Pastoral da Terra de Minas Gerais



Solidariedade com as famílias de Maceió e denúncia dos crimes da mineração

Foto: UFAL – Universidade Federal de Alagoas

A Comissão para a Ecologia Integral e Mineração, da Conferência Nacional dos Bispos do Brasil, expressa solidariedade às famílias desalojadas em Maceio (AL) e denuncia os crimes continuados perpetrados pela Braskem, que violam os direitos humanos e da natureza e a conivência da prefeitura e do Estado.  Aproximadamente de 60 mil pessoas foram deslocadas dos bairros impactados exploração subterrânea de sal-gema.

Abaixo, a íntegra da nota

Enquanto a crise socioambiental atinge seus limites, o extrativismo predatório da mineração emerge como a expressão mais emblemática da insustentabilidade deste sistema. O cenário vivenciado em Maceió, Alagoas, configura, na realidade, um crime continuado perpetrado pela empresa petroquímica Brasken, evidenciando a perversidade intrínseca à mineração no Brasil, com a conivência do Estado. Os crimes da mineração, no Brasil se acumulam e demonstram que a propalada mineração sustentável ou verde é uma mentira. As violações dos direitos humanos, abrangendo o direito à cidade, moradia, trabalho, educação, saúde, vida digna e meio ambiente saudável, tornaram-se parte do cotidiano imposto pela Brasken.

O avanço das minas sob as casas na capital alagoana já resultou na expulsão de mais de 60 mil famílias, transformando áreas antes habitadas em bairros fantasmas. Recentemente, veio a público o iminente colapso da Mina 18, ameaçando a vida da lagoa Mundaú, seus pescadores e outros residentes vulneráveis. Na madrugada, mais de 20 famílias foram despejadas e alojadas em abrigos de emergência, enquanto um hospital da região transferiu todos os seus pacientes para outras unidades de saúde.

Em conformidade com a nota pública da Comissão Pastoral da Terra do Estado de Alagoas, repudiamos veementemente: “com base em testemunhos, a truculência por parte da Defesa Civil municipal, utilizando a força policial e as viaturas da Braskem para remover as pessoas de suas casas na madrugada da quinta-feira (30/11), oferecendo apenas escolas creches como abrigo delas, mas sem respeito às suas escolhas, propriedades e, inclusive, aos pertences pessoais que tiveram que ser deixados para trás. Também não houve sensibilidade com os pacientes do Hospital Sanatório, realocados às pressas para outras unidades de saúde. Tais situações podem se configurar como graves violações de direitos humanos”.

A Comissão para Ecologia Integral e Mineração da CNBB expressa solidariedade às famílias desalojadas e denuncia, ainda, o acordo recente firmado entre prefeitura de Maceió e Braskem no âmbito da Ação Civil Pública n° 0808806-65.2023.4.05.8000 (ACP dos Moradores), pelo qual, mediante ao pagamento de 1,7 bilhões de reais, o município dará a quitação plena de todo o passivo ambiental da companhia, doando áreas públicas e isentando a empresa de danos futuros.

Somente em 2021, as renúncias fiscais concedidas à Braskem somaram R$ 791,5 milhões de reais. A maior parte (R$ 726 milhões) foi concedida pelas operações da Braskem na região nordeste, por meio da SUDENE. São renúncias que existem desde a metade do século passado e que acabaram de ser renovadas pelo Congresso brasileiro por mais 5 anos.

O Estado, portanto, apoia as operações das corporações mineiras por meio de benefícios fiscais e recebe dinheiro silenciando-se sobre as violações e danos provocados por elas.    Mais um caso em que a mineração impacta milhares de vidas e destrói o meio ambiente está ficando impune. Exigimos das autoridades a penalização criminal e civil. Cabe também à União tomar as devidas providências, cobrando o papel que lhe compete, uma vez que os bens do subsolo pertencem à União, incluindo a responsabilidade por sua proteção.

É urgente superar esse modelo extrativista que coloca o lucro acima da vida. Continuemos lutando pela Ecologia Integral, conscientes de que tudo está interligado em nossa casa comum: quando cuidamos da terra, ela também cuida de nós.

Livramento de Nossa Senhora (BA), 4 de dezembro de 2023

Dom Vicente Ferreira

Presidente da Comissão para Ecologia Integral e Mineração