sexta-feira, 31 de outubro de 2014

Declaração Final: Encontro Movimentos Sociais com o Papa: Carta dos Excluídos aos Excluídos

O histórico Encontro Mundial dos Movimentos Sociais (EMMS) com o Papa Francisco debateu três temas principais – pão, terra e lar – e produziu uma Declaração Final, uma espécie de "Carta dos Excluídos ao Excluídos”, que servirá de base de trabalho para os movimentos sociais em seus respectivos países. O Encontro ocorreu entre os dias 27 de 29 de outubro, no Vaticano

Declaração Final do Encontro Mundial dos Movimentos Populares

Como parte da conclusão do EMMP, queremos fazer chegar à opinião pública um breve resumo do que aconteceu durante estes três históricos dias.

1. Convocado pelo PCJP, a PAS e diversos movimentos populares do mundo sob a inspiração do Papa Francisco, uma delegação de mais de 100 dirigentes sociais de todos os continentes se reuniu em Roma para debater três eixos: terra, trabalho, moradia; os grandes problemas e desafios que enfrenta a família humana (especialmente exclusão, desigualdade, violência e crise ambiental) a partir da perspectiva dos pobres e suas organizações.

2. As jornadas se desenvolveram procurando praticar a Cultura do Encontro e integrando companheiros, companheiras, irmãos e irmãs, de distintos continentes, gerações, ofícios, religiões, ideias e experiências. Além dos setores representativos dos três eixos principais do encontro, participaram um número considerável de bispos e agentes pastorais, intelectuais e acadêmicos, que contribuíram significativamente ao encontro, sempre respeitando o protagonismo dos setores e movimentos populares. O Encontro não esteve isento de tensões que pudéssemos assumir coletivamente como irmãos.

3. Em primeiro lugar, sempre desde a perspectiva dos pobres e dos povos pobres (neste caso os camponeses, trabalhadores sem direitos e habitantes de bairros populares), foi analisado as causas estruturais da desigualdade e da exclusão, desde suas raízes sistêmicas global até suas expressões locais. Compartilharam os números horríveis da desigualdade e a concentração da riqueza nas mãos de um punhado de milionários. Os painelistas e palestrantes concordaram que se deve buscar na natureza desigual e predatória do sistema capitalista que coloca o lucro acima do ser humano a raiz dos males sociais e ambientais. O enorme poder das empresas transnacionais que pretendem devorar e privatizar tudo –mercadorias, serviços, pensamento- são o primeiro violino desta sinfonia de destruição.

4. Durante o trabalho nas oficinas conclui-se que o aceso pleno, estável, seguro e integral à terra, o trabalho e a moradia constituem direitos humanos inalienáveis, inerente às pessoas e sua dignidade, que devem ser garantidas e respeitadas. A moradia e o bairro como um espaço inviolável por Estados e corporações, a terra como um bem comum que deve ser compartido entre todos os que nela trabalham evitando sua acumulação, e o trabalho digno como eixo estruturador de um projeto de vida foram algumas das reivindicações compartilhadas.

5. Também abordamos o problema da violência e da guerra, uma guerra total, ou como disse Francisco, uma terceira guerra mundial parcelada. Sem perder de vista o caráter global destes problemas, tratou-se com particular intensidade a situação do Oriente Médio, principalmente a agressão contra o povo palestino e curdo. A violência que desencadeiam as máfias do narcoterrorismo, o tráfico de armas e o tráfico de pessoas também foram objeto de profundo debate. Os despejos forçados pela violência, o agronegócio, a mineração poluente e todas as formas de extrativismo, e a repressão sobre camponeses, povos originários e afrodecendentes estiveram presentes em todos os debates. Também o grave problema dos golpes de estado como em Honduras e Paraguai e o intervencionismo de grandes potências sobre os países mais pobres.

6. A questão ambiental esteve presente num rico intercâmbio entre a perspectiva acadêmica e a popular. Pudemos conhecer os dados mais recentes sobre contaminação e a mudança climática, as previsões sobre futuros desastres naturais e as provas científicas de que o consumismo insaciável e a prática de um industrialismo irresponsável que promove o poder econômico explicam a catástrofe ecológica em cena. Devemos combater a cultura do descarte, e ainda que suas causas sejam estruturais, também devemos promover uma mudança desde abaixo, nos hábitos e condutas de nossos povos, priorizando os intercâmbios ao interior da economia popular e a recuperação do que este sistema renega.

7. Novamente, pudemos concluir que a guerra e a violência, a exacerbação dos conflitos étnicos e a utilização da religião para a legitimação da violência, assim como o desmatamento, a mudança climática e a perda da biodiversidade, tem seu principal motor a busca incessante do lucro e a pretensão criminosa de subordinar os povos mais pobres para saquear suas riquezas naturais e humanas. Consideramos que a ação e as palavras dos movimentos populares e a Igreja são imprescindíveis para frear este verdadeiro genocídio e terricídio.

8. Particular atenção merece à situação das mulheres golpeadas por este sistema. Reconhecemos nessa realidade a urgente necessidade de um compromisso profundo e sério com essa causa justa e histórica de todas nossas companheiras, motor de lutas, processos e propostas de vida, emancipatórias e inspiradoras. Também exigimos a finalização da estigmatização, descarte e abandono das crianças e jovens, especialmente os pobres, afrodecendentes e migrantes. Se as crianças não têm infância, se os jovens não têm projeto, a Terra não tem futuro. 

9. Longe de ficarmos na autocompaixão e nos lamentos por todas estas realidades destruidoras, os movimentos populares, em particular os reunidos neste Encontro, reivindicamos que os excluídos, os oprimidos, os pobres não resignados, organizados, podemos e devemos enfrentar com todas nossas forças a caótica situação a que este sistema nos levou. Neste sentido, foram compartilhadas inúmeras experiências de trabalho, organização e luta que tem permitido a criação de milhões de fontes de trabalho digno no setor popular da economia, a recuperação de milhões de hectares de terra para a agricultura camponesa e a construção, integração, melhoramento ou defesa de milhões de moradias e comunidades urbanas no mundo. A participação protagonizada pelos setores populares em democracias seqüestradas ou diretamente plutocracias é indispensável para as transformações que necessitamos.

10. Tendo em conta o especial contexto deste encontro e a inestimável contribuição da Igreja Católica que, encabeçada pelo Papa Francisco, permitiu sua realização, nos detivemos para analisar o marco de nossas realidades o imprescindível aporte da doutrina social da igreja e o pensamento de seu pastor para a luta por justiça social. Nosso material principal de trabalho foi a Evengelii Gaudium que levou em conta a necessidade de recuperar pautas éticas de conduta na dimensão individual, grupal e social da vida humana. É razoável destacar a participação e intervenção de numerosos sacerdotes e bispos católicos ao longo de todo Encontro, encarnação viva de todos aqueles agentes pastorais laicos e consagrados, comprometidos com as lutas populares que, consideramos, devem ser reforçados no seu importante labor.

11. Todos e todas, muitos de nós católicos, pudemos assistir a celebração de uma missa na Catedral de São Pedro, celebrada por um de nossos anfitriões, o Cardeal Peter Turkson, onde foram apresentadas como oferendas três símbolos de nossos anseios, carências e lutas: um carro de papelão, frutos da terra camponesa e uma maquete de uma casa típica dos bairros pobres. Pudemos contar com a presença de um importante número de bispos de todos os continentes.

12. Neste ambiente de debate apaixonado e fraternidade intercultural, tivemos a inesquecível oportunidade de assistir a um momento histórico: a participação do Papa Francisco no nosso Encontro que sintetizou em seu discurso grande parte de nossa realidade, nossas denuncias e nossas propostas. A claridade e contundência de suas palavras não admitiram duas interpretações e reafirmam que a preocupação pelos pobres está no centro do Evangelio. Em coerência com suas palavras, a atitude fraterna, paciente e cálida de Francisco com todos e cada um de nós, em especial com os perseguidos, também expressa sua solidariedade com nossa luta, tantas vezes desvalorizada e prejudicada, inclusive perseguida, reprimida ou criminalizada.

13. Outro dos momentos importantes foi a participação do irmão Evo Morales, presidente da Assembleia Mundial dos Povos Indígenas, que participou em caráter de dirigente popular e nos ofereceu uma exposição centrada na crítica ao sistema capitalista e em tudo o que os excluídos podem fazer em relação à terra, trabalho, moradia, paz e ambiente quando nos organizamos e temos acesso a posições de poder, de um poder entendido como serviço e não como privilegio. Seu abraço com Francisco nos emocionou e ficará para sempre em nossa memória.

14. Entre os encaminhamentos imediatos do encontro, levamos duas coisas: a “Carta dos excluídos aos excluídos” para trabalhar com as bases dos setores e movimentos populares, a qual nos comprometemos a distribuir massivamente junto ao Discurso do Papa Francisco, e as memórias; e a proposta de criar um Espaço de Interlocução permanente entre os movimentos populares e a Igreja.

15. Junto a este breve comunicado, pedimos especialmente a todos os trabalhadores e trabalhadoras da imprensa que nos ajudem a difundir a versão completa do discurso do Papa Francisco que, repetimos, sintetiza grande parte de nossa experiência, pensamentos e anseios. Repitamos junto: Terra, Teto e Trabalho são direitos sagrados! Nenhum trabalhador sem direitos! Nenhuma família sem moradia! Nenhum camponês sem terra! Nenhum povo sem território! Viva os pobres que se organizam e lutam por uma alternativa humana à globalização excludente!  Longa vida ao Papa Francisco e sua Igreja pobre para os pobres!


quarta-feira, 29 de outubro de 2014

Papa defende a luta por terra urbana e rural, moradia e trabalho

Entre os dias 27 e 29 de outubro, ocorre o Encontro Mundial dos Movimentos Populares, promovido pelo Pontifício Conselho Justiça e Paz, em colaboração com a Pontifícia Academia das Ciências Sociais. Nesta terça-feira, o Papa Francisco proferiu o seu discurso aos participantes do encontro.
"Este encontro nosso – afirmou Francisco – responde a um anseio muito concreto, algo que qualquer pai, qualquer mãe quer para os seus filhos; um anseio que deveria estar ao alcance de todos, mas que hoje vemos com tristeza cada vez mais longe da maioria: terra, teto e trabalho. É estranho, mas, se eu falo disso para alguns, significa que o papa é comunista. Não se entende que o amor pelos pobres está no centro do Evangelho. Terra, teto e trabalho – isso pelo qual vocês lutam – são direitos sagrados. Reivindicar isso não é nada raro, é a doutrina social da Igreja."
O discurso foi publicado no sítio da Santa Sé, 28-10-2014. A tradução é de Moisés Sbardelotto.
Eis o texto.
Discurso do Santo Padre Francisco aos participantes do Encontro Mundial de Movimentos Populares
Bom dia de novo. Eu estou contente por estar no meio de vocês. Aliás, vou lhes fazer uma confidência: é a primeira vez que eu desço aqui [na Aula Velha do Sínodo], nunca tinha vindo.
Como lhes dizia, tenho muita alegria e lhes dou calorosas boas-vindas. Obrigado por terem aceitado este convite para debater tantos graves problemas sociais que afligem o mundo hoje, vocês, que sofrem em carne própria a desigualdade e a exclusão. Obrigado ao cardeal Turkson pela sua acolhida. Obrigado, Eminência, pelo seu trabalho e pelas suas palavras.
Este encontro de Movimentos Populares é um sinal, é um grande sinal: vocês vieram colocar na presença de Deus, da Igreja, dos povos, uma realidade muitas vezes silenciada. Os pobres não só padecem a injustiça, mas também lutam contra ela!
Não se contentam com promessas ilusórias, desculpas ou pretextos. Também não estão esperando de braços cruzados a ajuda de ONGs, planos assistenciais ou soluções que nunca chegam ou, se chegam, chegam de maneira que vão em uma direção ou de anestesiar ou de domesticar. Isso é meio perigoso. Vocês sentem que os pobres já não esperam e querem ser protagonistas, se organizam, estudam, trabalham, reivindicam e, sobretudo, praticam essa solidariedade tão especial que existe entre os que sofrem, entre os pobres, e que a nossa civilização parece ter esquecido ou, ao menos, tem muita vontade de esquecer.
Solidariedade é uma palavra que nem sempre cai bem. Eu diria que, algumas vezes, a transformamos em um palavrão, não se pode dizer; mas é uma palavra muito mais do que alguns atos de generosidade esporádicos. É pensar e agir em termos de comunidade, de prioridade de vida de todos sobre a apropriação dos bens por parte de alguns. Também é lutar contra as causas estruturais da pobreza, a desigualdade, a falta de trabalho, de terra e de moradia, a negação dos direitos sociais e trabalhistas. É enfrentar os destrutivos efeitos do Império do dinheiro: os deslocamentos forçados, as migrações dolorosas, o tráfico de pessoas, a droga, a guerra, a violência e todas essas realidades que muitos de vocês sofrem e que todos somos chamados a transformar. A solidariedade, entendida em seu sentido mais profundo, é um modo de fazer história, e é isso que os movimentos populares fazem.
Este encontro nosso não responde a uma ideologia. Vocês não trabalham com ideias, trabalham com realidades como as que eu mencionei e muitas outras que me contaram... têm os pés no barro, e as mãos, na carne. Têm cheiro de bairro, de povo, de luta! Queremos que se ouça a sua voz, que, em geral, se escuta pouco. Talvez porque incomoda, talvez porque o seu grito incomoda, talvez porque se tem medo da mudança que vocês reivindicam, mas, sem a sua presença, sem ir realmente às periferias, as boas propostas e projetos que frequentemente ouvimos nas conferências internacionais ficam no reino da ideia, é meu projeto.
Não é possível abordar o escândalo da pobreza promovendo estratégias de contenção que unicamente tranquilizem e convertam os pobres em seres domesticados e inofensivos. Como é triste ver quando, por trás de supostas obras altruístas, se reduz o outro à passividade, se nega ele ou, pior, se escondem negócios e ambições pessoais: Jesus lhes chamaria de hipócritas. Como é lindo, ao contrário, quando vemos em movimento os Povos, sobretudo os seus membros mais pobres e os jovens. Então, sim, se sente o vento da promessa que aviva a esperança de um mundo melhor. Que esse vento se transforme em vendaval de esperança. Esse é o meu desejo.
Este encontro nosso responde a um anseio muito concreto, algo que qualquer pai, qualquer mãe quer para os seus filhos; um anseio que deveria estar ao alcance de todos, mas que hoje vemos com tristeza cada vez mais longe da maioria: terrateto e trabalho. É estranho, mas, se eu falo disso para alguns, significa que o papa é comunista.
Não se entende que o amor pelos pobres está no centro do Evangelho. Terra, teto e trabalho – isso pelo qual vocês lutam – são direitos sagrados. Reivindicar isso não é nada raro, é a doutrina social da Igreja. Vou me deter um pouco sobre cada um deles, porque vocês os escolheram como tema para este encontro.
Terra. No início da criação, Deus criou o homem, guardião da sua obra, encarregando-o de cultivá-la e protegê-la. Vejo que aqui há dezenas de camponeses e camponesas, e quero felicitá-los por cuidar da terra, por cultivá-la e por fazer isso em comunidade. Preocupa-me a erradicação de tantos irmãos camponeses que sobrem o desenraizamento, e não por guerras ou desastres naturais. A apropriação de terras, o desmatamento, a apropriação da água, os agrotóxicos inadequados são alguns dos males que arrancam o homem da sua terra natal. Essa dolorosa separação, que não é só física, mas também existencial e espiritual, porque há uma relação com a terra que está pondo a comunidade rural e seu modo de vida peculiar em notória decadência e até em risco de extinção.
A outra dimensão do processo já global é a fome. Quando a especulação financeira condiciona o preço dos alimentos, tratando-os como qualquer mercadoria, milhões de pessoas sofrem e morrem de fome. Por outro lado, descartam-se toneladas de alimentos. Isso é um verdadeiro escândalo. A fome é criminosa, a alimentação é um direito inalienável. Eu sei que alguns de vocês reivindicam uma reforma agrária para solucionar alguns desses problemas, e deixem-me dizer-lhes que, em certos países, e aqui cito o Compêndio da Doutrina Social da Igreja, "a reforma agrária é, além de uma necessidade política, uma obrigação moral" (CDSI, 300).
Não sou só eu que digo isso. Está no Compêndio da Doutrina Social da Igreja. Por favor, continuem com a luta pela dignidade da família rural, pela água, pela vida e para que todos possam se beneficiar dos frutos da terra.
Em segundo lugar, teto. Eu disse e repito: uma casa para cada família. Nunca se deve esquecer de que Jesus nasceu em um estábulo porque na hospedagem não havia lugar, que a sua família teve que abandonar o seu lar e fugir para o Egito, perseguida por Herodes. Hoje há tantas famílias sem moradia, ou porque nunca a tiveram, ou porque a perderam por diferentes motivos. Família e moradia andam de mãos dadas. Mas, além disso, um teto, para que seja um lar, tem uma dimensão comunitária: e é o bairro... e é precisamente no bairro onde se começa a construir essa grande família da humanidade, a partir do mais imediato, a partir da convivência com os vizinhos.
Hoje, vivemos em imensas cidades que se mostram modernas, orgulhosas e até vaidosas. Cidades que oferecem inúmeros prazeres e bem-estar para uma minoria feliz... mas se nega o teto a milhares de vizinhos e irmãos nossos, inclusive crianças, e eles são chamados, elegantemente, de "pessoas em situação de rua". É curioso como no mundo das injustiças abundam os eufemismos. Não se dizem as palavras com a contundência, e busca-se a realidade no eufemismo. Uma pessoa, uma pessoa segregada, uma pessoa apartada, uma pessoa que está sofrendo a miséria, a fome, é uma pessoa em situação de rua: palavra elegante, não? Vocês, busquem sempre, talvez me equivoque em algum, mas, em geral, por trás de um eufemismo há um crime.
Vivemos em cidades que constroem torres, centros comerciais, fazem negócios imobiliários... mas abandonam uma parte de si nas margens, nas periferias. Como dói escutar que os assentamentos pobres são marginalizados ou, pior, quer-se erradicá-los! São cruéis as imagens dos despejos forçados, dos tratores derrubando casinhas, imagens tão parecidas às da guerra. E isso se vê hoje.
Vocês sabem que, nos bairros populares, onde muitos de vocês vivem, subsistem valores já esquecidos nos centros enriquecidos. Os assentamentos estão abençoados com uma rica cultura popular: ali, o espaço público não é um mero lugar de trânsito, mas uma extensão do próprio lar, um lugar para gerar vínculos com os vizinhos. Como são belas as cidades que superam a desconfiança doentia e integram os diferentes e que fazem dessa integração um novo fator de desenvolvimento. Como são lindas as cidades que, ainda no seu desenho arquitetônico, estão cheias de espaços que conectam, relacionam, favorecem o reconhecimento do outro.
Por isso, nem erradicação, nem marginalização: é preciso seguir na linha da integração urbana. Essa palavra deve substituir completamente a palavra erradicação, desde já, mas também esses projetos que pretendem envernizar os bairros populares, ajeitar as periferias e maquiar as feridas sociais, em vez de curá-las, promovendo uma integração autêntica e respeitosa. É uma espécie de direito arquitetura de maquiagem, não? E vai por esse lado. Sigamos trabalhando para que todas as famílias tenham uma moradia e para que todos os bairros tenham uma infraestrutura adequada (esgoto, luz, gás, asfalto e continuo: escolas, hospitais ou salas de primeiros socorros, clube de esportes e todas as coisas que criam vínculos e que unem, acesso à saúde – já disse – e à educação e à segurança.
Terceiro, trabalho. Não existe pior pobreza material – urge-me enfatizar isto –, não existe pior pobreza material do que a que não permite ganhar o pão e priva da dignidade do trabalho. O desemprego juvenil, a informalidade e a falta de direitos trabalhistas não são inevitáveis, são o resultado de uma prévia opção social, de um sistema econômico que coloca os lucros acima do homem, se o lucro é econômico, sobre a humanidade ou sobre o homem, são efeitos de uma cultura do descarte que considera o ser humano em si mesmo como um bem de consumo, que pode ser usado e depois jogado fora.
Hoje, ao fenômeno da exploração e da opressão, soma-se uma nova dimensão, um matiz gráfico e duro da injustiça social; os que não podem ser integrados, os excluídos são resíduos, "sobrantes". Essa é a cultura do descarte, e sobre isso gostaria de ampliar algo que não tenho por escrito, mas que lembrei agora. Isso acontece quando, no centro de um sistema econômico, está o deus dinheiro e não o homem, a pessoa humana. Sim, no centro de todo sistema social ou econômico, tem que estar a pessoa, imagem de Deus, criada para que fosse o denominador do universo. Quando a pessoa é deslocada e vem o deus dinheiro, acontecesse essa inversão de valores.
E, para explicitar, lembro um ensinamento de cerca do ano 1200. Um rabino judeu explicava aos seus fiéis a história da torre de Babel e, então, contava como, para construir essa torre de Babel, era preciso fazer muito esforço, era preciso fazer os tijolos; para fazer os tijolos, era preciso fazer o barro e trazer a palha, e amassar o barro com a palha; depois, cortá-lo em quadrados; depois, secá-lo; depois, cozinhá-lo; e, quando já estavam cozidos e frios, subi-los, para ir construindo a torre.
Se um tijolo caía – o tijolo era muito caro –, com todo esse trabalho, se um tijolo caía, era quase uma tragédia nacional. Aquele que o deixara cair era castigado ou suspenso, ou não sei o que lhe faziam. E se um operário caía não acontecia nada. Isso é quando a pessoa está a serviço do deus dinheiro, e isso era contado por um rabino judeu no ano 1200, explicando essas coisas horríveis.
E, a respeito do descarte, também temos que estar um pouco atentos ao que acontece na nossa sociedade. Estou repetindo coisas que disse e que estão na Evangelii gaudium. Hoje em dia, descartam-se as crianças porque a taxa de natalidade em muitos países da terra diminuiu, ou se descartam as crianças porque não se ter alimentação, ou porque são mortas antes de nascerem, descarte de crianças.
Descartam-se os idosos, porque, bom, não servem, não produzem. Nem crianças nem idosos produzem. Então, sistemas mais ou menos sofisticados vão os abandonando lentamente. E agora como é necessário, nesta crise, recuperar um certo equilíbrio. Estamos assistindo a um terceiro descarte muito doloroso, o descarte dos jovens. Milhões de jovens. Eu não quero dizer o dado, porque não o sei exatamente, e a que eu li parece um pouco exagerado, mas milhões de jovens descartados do trabalho, desempregados.
Nos países da Europa – e estas são estatísticas muito claras –, aqui na Itália, passou um pouquinho dos 40% de jovens desempregados. Sabem o que significa 40% de jovens? Toda uma geração, anular toda uma geração para manter o equilíbrio. Em outro país da Europa, está passando os 50% e, nesse mesmo país dos 50%, no sul são 60%. São dados claros, ou seja, do descarte. Descarte de crianças, descarte de idosos, que não produzem, e temos que sacrificar uma geração de jovens, descarte de jovens, para poder manter e reequilibrar um sistema em cujo centro está o deus dinheiro, e não a pessoa humana.
Apesar disso, a essa cultura de descarte, a essa cultura dos sobrantes, muitos de vocês, trabalhadores excluídos, sobrantes para esse sistema, foram inventando o seu próprio trabalho com tudo aquilo que parecia não poder dar mais de si mesmo... mas vocês, com a sua artesanalidade que Deus lhes deu, com a sua busca, com a sua solidariedade, com o seu trabalho comunitário, com a sua economia popular, conseguiram e estão conseguindo... E, deixem-me dizer isto, isso, além de trabalho, é poesia. Obrigado.
Desde já, todo trabalhador, esteja ou não no sistema formal do trabalho assalariado, tem direito a uma remuneração digna, à segurança social e a uma cobertura de aposentadoria. Aqui há papeleiros, recicladores, vendedores ambulantes, costureiros, artesãos, pescadores, camponeses, construtores, mineiros, operários de empresas recuperadas, todos os tipos de cooperativados e trabalhadores de ofícios populares que estão excluídos dos direitos trabalhistas, aos quais é negada a possibilidade de se sindicalizar, que não têm uma renda adequada e estável. Hoje, quero unir a minha voz à sua e acompanhá-los na sua luta.
Neste encontro, também falaram da Paz e da Ecologia. É lógico: não pode haver terra, não pode haver teto, não pode haver trabalho se não temos paz e se destruímos o planeta. São temas tão importantes que os Povos e suas organizações de base não podem deixar de debater. Não podem deixar só nas mãos dos dirigentes políticos. Todos os povos da terra, todos os homens e mulheres de boa vontade têm que levantar a voz em defesa desses dois dons preciosos: a paz e a natureza. A irmã mãe Terra, como chamava São Francisco de Assis.
Há pouco tempo, eu disse, e repito, que estamos vivendo a terceira guerra mundial, mas em cotas. Há sistemas econômicos que, para sobreviver, devem fazer a guerra. Então, fabricam e vendem armas e, com isso, os balanços das economia que sacrificam o homem aos pés do ídolo do dinheiro, obviamente, ficam saneados. E não se pensa nas crianças famintas nos campos de refugiados, não se pensa nos deslocamentos forçados, não se pensa nas moradias destruídas, não se pensa, desde já, em tantas vidas ceifadas. Quanto sofrimento, quanta destruição, quanta dor. Hoje, queridos irmãos e irmãs, se levanta em todas as partes da terra, em todos os povos, em cada coração e nos movimentos populares, o grito da paz: nunca mais a guerra!
Um sistema econômico centrado no deus dinheiro também precisa saquear a natureza, saquear a natureza, para sustentar o ritmo frenético de consumo que lhe é inerente. As mudanças climáticas, a perda da biodiversidade, o desmatamento já estão mostrando seus efeitos devastadores nos grandes cataclismos que vemos, e os que mais sofrem são vocês, os humildes, os que vivem perto das costas em moradias precárias, ou que são tão vulneráveis economicamente que, diante de um desastre natural, perdem tudo.
Irmãos e irmãs, a criação não é uma propriedade da qual podemos dispor ao nosso gosto; muito menos é uma propriedade só de alguns, de poucos: a criação é um dom, é um presente, um dom maravilhoso que Deus nos deu para que cuidemos dele e o utilizemos em benefício de todos, sempre com respeito e gratidão. Talvez vocês saibam que eu estou preparando uma encíclica sobre Ecologia: tenham a certeza de que as suas preocupações estarão presentes nela. Agradeço-lhes, aproveito para lhes agradecer, pela carta que os integrantes da Via Campesina, daFederação dos Papeleiros e tantos outros irmãos me fizeram chegar sobre o assunto.
Falamos da terra, de trabalho, de teto... falamos de trabalhar pela paz e cuidar da natureza... Mas por que, em vez disso, nos acostumamos a ver como se destrói o trabalho digno, se despejam tantas famílias, se expulsam os camponeses, se faz a guerra e se abusa da natureza? Porque, nesse sistema, tirou-se o homem, a pessoa humana, do centro, e substituiu-se por outra coisa. Porque se presta um culto idólatra ao dinheiro. Porque se globalizou a indiferença! Se globalizou a indiferença. O que me importa o que acontece com os outros, desde que eu defenda o que é meu? Porque o mundo se esqueceu de Deus, que é Pai; tornou-se um órfão, porque deixou Deus de lado.
Alguns de vocês expressaram: esse sistema não se aguenta mais. Temos que mudá-lo, temos que voltar a levar a dignidade humana para o centro, e que, sobre esse pilar, se construam as estruturas sociais alternativas de que precisamos. É preciso fazer isso com coragem, mas também com inteligência. Com tenacidade, mas sem fanatismo. Com paixão, mas sem violência. E entre todos, enfrentando os conflitos sem ficar presos neles, buscando sempre resolver as tensões para alcançar um plano superior de unidade, de paz e de justiça.
Os cristãos têm algo muito lindo, um guia de ação, um programa, poderíamos dizer, revolucionário. Recomendo-lhes vivamente que o leiam, que leiam as Bem-aventuranças que estão no capítulo 5 de São Mateus e 6 de São Lucas(cfr. Mt 5, 3; e Lc 6, 20) e que leiam a passagem de Mateus 25. Eu disse isso aos jovens no Rio de Janeiro. Com essas duas coisas, vocês têm o programa de ação.
Sei que entre vocês há pessoas de distintas religiões, ofícios, ideias, culturas, países, continentes. Hoje, estão praticando aqui a cultura do encontro, tão diferente da xenofobia, da discriminação e da intolerância que vemos tantas vezes. Entre os excluídos, dá-se esse encontro de culturas em que o conjunto não anula a particularidade, o conjunto não anula a particularidade. Por isso eu gosto da imagem do poliedro, uma figura geométrica com muitas caras distintas. O poliedro reflete a confluência de todas as particularidades que, nele, conservam a originalidade. Nada se dissolve, nada se destrói, nada se domina, tudo se integra, tudo se integra. Hoje, vocês também estão buscando essa síntese entre o local e o global. Sei que trabalham dia após dia no próximo, no concreto, no seu território, seu bairro, seu lugar de trabalho: convido-os também a continuarem buscando essa perspectiva mais ampla, que nossos sonhos voem alto e abranjam tudo.
Assim, parece-me importante essa proposta que alguns me compartilharam de que esses movimentos, essas experiências de solidariedade que crescem a partir de baixo, a partir do subsolo do planeta, confluam, estejam mais coordenadas, vão se encontrando, como vocês fizeram nestes dias. Atenção, nunca é bom espartilhar o movimento em estruturas rígidas. Por isso, eu disse encontra-se. Também não é bom tentar absorvê-lo, dirigi-lo ou dominá-lo; movimentos livres têm a sua dinâmica própria, mas, sim, devemos tentar caminhar juntos. Estamos neste salão, que é o salão do Sínodo velho. Agora há um novo. E sínodo significa precisamente "caminhar juntos": que esse seja um símbolo do processo que vocês começaram e estão levando adiante.
Os movimentos populares expressam a necessidade urgente de revitalizar as nossas democracias, tantas vezes sequestradas por inúmeros fatores. É impossível imaginar um futuro para a sociedade sem a participação protagônica das grandes maiorias, e esse protagonismo excede os procedimentos lógicos da democracia formal. A perspectiva de um mundo da paz e da justiça duradouras nos exige superar o assistencialismo paternalista, nos exige criar novas formas de participação que inclua os movimentos populares e anime as estruturas de governo locais, nacionais e internacionais com essa torrente de energia moral que surge da incorporação dos excluídos na construção do destino comum. E isso com ânimo construtivo, sem ressentimento, com amor.
Eu os acompanho de coração nesse caminho. Digamos juntos com o coração: nenhuma família sem moradia, nenhum agricultor sem terra, nenhum trabalhador sem direitos, nenhuma pessoa sem a dignidade que o trabalho dá.
Queridos irmãos e irmãs: sigam com a sua luta, fazem bem a todos nós. É como uma bênção de humanidade. Deixo-lhes de recordação, de presente e com a minha bênção, alguns rosários que foram fabricados por artesãos, papeleiros e trabalhadores da economia popular da América Latina.
E nesse acompanhamento eu rezo por vocês, rezo com vocês e quero pedir ao nosso Pai Deus que os acompanhe e os abençoe, que os encha com o seu amor e os acompanhe no caminho, dando-lhes abundantemente essa força que nos mantém de pé: essa força é a esperança, a esperança que não desilude. Obrigado.
FONTE: FHU

terça-feira, 28 de outubro de 2014

Papa aos movimentos populares: "Continuem a Luta"

"Digamos, juntos com o coração, nenhuma família sem teto, nenhum camponês sem terra, nenhum trabalhador sem direitos, nenhuma pessoa sem a dignidade do trabalho." Papa Francisco tomou a palavra na frente dos principais movimentos populares de todo o mundo, convidados para uma reunião. Ele os exortou a "continuar a luta, é bom para todos."

"Terra, trabalho, casa. É estranho, mas se eu falar sobre isso para alguns, é que o Papa é um comunista" ao invés disso "amor pelos pobres é o coração do Evangelho" e a doutrina social da Igreja. Disse o Papa aos movimentos populares, enfatizando que esta reunião "não responde a nenhuma ideologia." Isso foi relatado pela Rádio Vaticano.

Papa Francisco dirigiu essas palavras às mais duzentos participantes de "movimentos populares", no encontro mundial que se realiza desde ontem até amanhã, em Roma, em uma longa audiência concedida a eles no Vaticano, hoje. Em um discurso amplo e pessoal, Jorge Mario Bergoglio denunciou a "globalização da indiferença" e a "cultura do desperdício" expressões caras a ele.  Prometeu que em sua encíclica sobre a ecologia, que está escrevendo, estará presente as "preocupações" dos movimentos populares, e, mencionando os três "t" do título de "Tierra, techo y trabajo", terra, moradia e emprego, disse (com citações implícita Helder Camara): "É estranho, mas se eu falar sobre isso para alguns é que o Papa é um comunista “.

"Obrigado por aceitar o convite para debater os vários e graves problemas sociais que o mundo enfrenta hoje, vocês que sofrem em primeira mão a desigualdade e exclusão", disse o Papa o argentino. "O encontro de movimentos populares é um sinal, um grande sinal: você trazer a presença de Deus, da Igreja e do povo, uma realidade que muitas vezes é passada em silêncio. Os pobres não apenas sofrem a injustiça, mas também lutam contra ela."

Os pobres "não estão satisfeitos com promessas ilusórias, desculpas ou álibis. Eles não estão esperando de braços cruzados a ajuda de organizações não-governamentais, planos de saúde ou soluções que nunca chegam, ou, se chegam ,chegam de tal maneira que vão em direção ou de anestesiar ou de domesticar”. Jesus, disse o Papa, chamaria essa atitude de "hipócritas". Mas os pobres querem ser "protagonistas, se organizam, estudam, trabalham, reivindicam e, acima de tudo, praticam a solidariedade especial que existe entre aqueles que estão sofrendo", uma solidariedade que a nossa sociedade tem muitas vezes se "esquecido" por considerar uma "palavrão". É, pois, necessário "combater as causas estruturais da pobreza, a desigualdade, a falta de mão de obra, terra e moradia, a negação dos direitos sociais e do trabalho", disse Bergoglio, que elogiou estes movimentos, muitas vezes não sindicalizados, porque "não trabalhamos com idéias, mas com a realidade.”

O Papa, que citou o Compêndio da Doutrina Social da Igreja e sua exortação apostólica "Evangelii Gaudium," se dirigiu sistematicamente nos três temas principais da conferência: terra, moradia e emprego. "É estranho, mas se eu falar sobre isso para alguns é que o Papa é um comunista", disse ele, mas "o amor pelos pobres é o coração do Evangelho."

Quanto à terra, o Papa denunciou o "escândalo" de milhões de pessoas que sofrem de fome, enquanto "a especulação financeira afeta o preço dos alimentos, tratando-os como qualquer outra mercadoria." Em seguida, o teto, "Eu disse e repito: uma casa para cada família", disse Bergoglio, observando que "no mundo das injustiças, abundam os eufemismos nos quais uma pessoa que sofre de pobreza é definida simplesmente 'sem-teto' ", mas "por trás de um eufemismo está um crime." O Pontífice jesuíta  herdeiro das reduções jesuítas elogiou a  “integração urbana” e aqueles que trabalham para garantir que cada família tenha uma casa e infra-estrutura adequada ("esgoto, energia elétrica, gás, asfalto e, em seguida: escolas, hospitais e pronto socorro, centros esportivos e todas as coisas que criam laços que unem e de acesso à saúde, educação, segurança”). A ausência de trabalho, enfim, é a maior "pobreza material", porque aqueles que não têm o trabalho não tem a "dignidade" e acabam vítimas de uma "cultura do desperdício", disse o Papa, recordando que no mundo há "milhões de jovens" desempregados e na Europa, inteiras gerações foram anuladas “para manter o equilíbrio".

Bergoglio então continuou seu discurso destacando a ligação entre estes três nós e a ligação entre a paz e a ecologia. Hoje, sublinhou, há uma "terceira guerra mundial em pedaços." Um sistema econômico focado no dinheiro, explora a natureza "para apoiar o rápido ritmo de consumo" e tem um impacto negativo sobre a mudança climática e no desmatamento, disse o Papa, assegurando aos movimentos populares que as suas preocupações estarão presentes em sua próxima encíclica sobre ‘ecologia'. O Papa então concluiu reiterando a sua condenação da "globalização da indiferença" e destacando o fato de que os movimentos populares “expressam a necessidade urgente de revitalizar a nossa democracia, tantas vezes sequestrada por muitos fatores.”

O Papa dirigiu-se aos movimentos populares em espanhol, porque muitos deles são da América Latina. Jorge Mario Bergoglio, no entanto, os conhecia desde quando era arcebispo de Buenos Aires. Com eles, observou o porta-voz do Vaticano, padre Federico Lombardi, o Papa se encontrou esta manhã "à vontade". O organizador da reunião, além do chanceler da Pontifícia Academia das Ciências Sociais, Mons. Marcelo Sanchez Sorondo, e o presidente do Conselho Pontifício Justiça e Paz, Cardeal Peter Turkson. Também organizador é Grabois Juan, da Argentina, chefe da Confederação dos Trabalhadores da economia popular e ex-advogado de "catadores", os ambulantes de rua que giram em megacidades da América do Sul catando papel para reciclar. O Papa citou-o implicitamente quando disse que você precisa "construir estruturas sociais alternativas" com "coragem, mas também com inteligência, tenacidade, mas sem fanatismo, com paixão, mas sem violência.”

FONTES: RADIO VATICANA, VATICAN INSIDER, IL MATTINO



segunda-feira, 27 de outubro de 2014

Iniciou no Vaticano, o Encontro Mundial dos Movimentos Populares


Começou esta manhã em Roma, o Encontro Mundial dos Movimentos Populares organizado pelo Conselho Pontifício Justiça e Paz. Se trata uma realidade que traz os trabalhadores temporários e da economia informal, migrantes, povos indígenas, trabalhadores sem terra e moradores de periferias.  Amanhã a audiência com o Papa. 
Para abrir o evento, a saudação do cardeal Peter Turkson, presidente do promotor do Vaticano Congregação. Também esteve presente o Juan Grabois, presidente da Confederação dos Trabalhadores da Economia Popular.
FONTE: RADIO VATICANA

quinta-feira, 23 de outubro de 2014

Encontro Mundial de Movimentos Populares no Vaticano

Pontifício Conselho Justiça e Paz, em colaboração com a Academia Pontifícia das Ciências Sociais e com líderes de diversos movimentos, organizou um Encontro Mundial de Movimentos Populares, que acontecerá de 27 a 29 de outubro de 2014.
A informação é publicada por Religión Digital, 21-10-2014. A tradução é do Cepat.
O primeiro e o terceiro dia acontecerão no Salesianum, na Via della Pisana. O segundo dia (28/10) na Aula Velha do Sínodo, com a participação do Santo Padre.
O encontro é destinado principalmente às organizações e movimentos dos excluídos. Espera-se a participação de aproximadamente 10 delegados de diferentes procedências, que reúnem:
a) os trabalhadores precarizados, temporários, migrantes, e os que participam no setor popular, informal e/ou de autogestão, sem proteção legal, reconhecimento sindical e nem direitos trabalhistas;
b) os camponeses sem terra e os povos indígenas ou as pessoas em risco de ser expulsas do campo por causa da especulação agrícola e a violência;
c) as pessoas que vivem nos subúrbios e assentamentos informais, os marginalizados, os esquecidos, sem infraestrutura urbana adequada.
Numerosos bispos e outros trabalhadores da Igreja de vários países também estão convidados, com o objetivo de estimular o diálogo e a colaboração com a Igreja. A reunião acontecerá em espanhol, francês, inglês, italiano e português.
O encontro será encerrado com a criação de uma instância internacional de coordenação entre os movimentos populares, com o apoio e colaboração da Igreja.
O trabalho está dividido em três dias:
a) O objetivo do primeiro dia é conhecer a realidade de hoje, as lutas e os pensamentos dos movimentos populares. Acontecerá no Salesianum;
b) O objetivo do segundo dia é apreciar o ensinamento do Papa Francisco sobre a forma de avançar juntos para um autêntico desenvolvimento humano integral. Acontecerá na Aula Velha do Sínodo;
c) O terceiro e último dia será dedicado ao levantamento de compromissos concretos para coordenar as organizações dos excluídos e sua colaboração com a Igreja. Acontecerá no Salesianum.
Na coletiva de imprensa, o Encontro Mundial será apresentado pelo cardeal Peter Turkson, presidente do Pontifício Conselho Justiça e Paz; por dom Marcelo Sánchez Sorondo, chanceler da Academia Pontifícia das Ciências Sociais; e por Juan Grabois, do Comitê Organizador do Encontro e da Confederação de Trabalhadores da Economia Popular.
FONTE:IHU

quinta-feira, 16 de outubro de 2014

"Sim, este Sínodo é uma grande notícia"

Sínodo dos bispos se tornou um evento dinâmico, com um duro debate sobre as novas pastorais na Igreja Católica. Isso é crédito do Papa Francisco, que exigiu uma discussão honesta e aberta, mas isso também pode colocá-lo diante de um dilema.
A nota é de John Travis, publicada no blog Decoding the Vatican, 15-10-2014. A tradução é de Moisés Sbardelotto.
Será que o Sínodo vai se concluir com um endosso claro do chamado do papa a um estilo de evangelização mais misericordioso e paciente, baseando-se – como afirmado na relatio intermediária do Sínodo – nos "elementos positivos" que podem ser encontrados até em relacionamentos e em uniões que a Igreja considera como "irregulares"?
Ou ele irá ajustar e qualificar esse documento com o tipo de declarações doutrinais voltadas a tranquilizar os católicos – e, acima de tudo, alguns dos bispos – de que não há nenhuma mudança no ensino fundamental da Igreja?
A resposta depende, em parte, dos sentimentos dos cerca de 200 bispos participantes e, em parte, de quão firmemente o papa irá puxar as rédeas do Sínodo. Neste momento, um documento sinodal "diluído" poderia ampliar o consenso na Aula do Sínodo, mas provavelmente seria visto como um apoio menos do que entusiasta para a agenda pastoral do papa.
Alguns setores dos comentaristas católicos estão agora tentando minimizar a relatio intermediária do Sínodo e, de forma não surpreendentemente, culpar a imprensa por inflar as expectativas de mudança.
Será que a mídia exagerou quando a relatio foi lida em voz alta na segunda-feira? Eu não penso assim. A mídia reconheceu no texto uma abordagem pastoral radicalmente nova a toda uma gama de questões matrimoniais e familiares e, em particular, um tom acolhedor em relação aos homossexuais.
Os bispos na Aula reconheceram a mesma coisa, e nem todos eles ficaram satisfeitos. É por isso que a Aula do Sínodo rapidamente se iluminou como uma máquina de pinball com questões e pedido de esclarecimentos.
Quanto ao peso dessa relatio, algumas coisas precisam ser ditas. Eu cubro Sínodos dos bispos há 30 anos, e a relatio intermediária é sempre onde as ideias expressadas nos discursos sinodais começam a se condensar. Em toda a semana passada, de fato, os repórteres no Vaticano foram orientados a não dar muita atenção às declarações sinodais individuais ou aos resumos diários – seria a relatiointermediária que distinguiria os temas realmente importantes.
É claro, o documento não é uma encíclica – ninguém disse que era. É claro, ele não muda a doutrina – todo mundo sabia disso. É claro, não pode haver modificações – isso foi relatado.
Mas, até agora, é o texto mais autorizado que sai dessa assembleia tão importante. E, ao contrário de assembleias anteriores (que usaram arelatio como um ponto de partida para escrever as "proposições" finais), a relatio desse Sínodo será o principal documento a ser apresentado, mesmo com possíveis revisões.
Quanto às objeções por parte de alguns bispos ao texto, eu não tenho dúvida de que elas são reais. Mas, quando o texto foi apresentado à imprensa na segunda-feira por parte de alguns dos seus autores, os repórteres foram repetidamente assegurados de que ele refletia acuradamente os principais temas do Sínodo. E, depois que a relatio foi lida em voz alta, houve um forte aplauso na Aula do Sínodo. Poderemos ver o quão fortes as objeções realmente são apenas quando virmos o texto final, revisado.
Eu acho que o alerta que está sendo expressado em alguns círculos da Igreja sobre a direção do Sínodo reflete um desconforto semelhante em relação a algumas das declarações do Papa Francisco durante os primeiros 18 meses. Quando o papa disse no ano passado "Uma pessoa gay que busca a Deus, que tem boa vontade – bem, quem sou eu para julgá-la?", ouvimos o mesmo tipo de reação: "Não há nenhuma novidade aí", "a Igreja não está mudando a sua doutrina" e "não prestem atenção nesses artigos de jornal".
Até agora, deve ficar claro que o papa está propondo uma mudança de paradigma no estilo da Igreja de evangelizar, uma mudança que favoreça o encontro e o diálogo sobre a identidade doutrinal, e ele quer que o Sínodo dos bispos a bordo. Essa é a notícia, a novidade, e ela merece atenção por parte de qualquer pessoa interessada na Igreja Católica.

terça-feira, 7 de outubro de 2014

Congresso eleito é o mais conservador desde 1964, afirma Diap

Apesar das manifestações de junho de 2013 - carregadas com o simbolismo de um movimento popular por renovação política e avanço nos direitos sociais - o resultado das eleições do último domingo, 5, revelou uma guinada em outra direção. Parlamentares conservadores se consolidaram como maioria na eleição da Câmara, de acordo com levantamento do Departamento Intersindical de Assessoria Parlamentar (Diap).
A reportagem é de Nivaldo Souza e Bernardo Caram, publicada pelo jornal O Estado de S. Paulo, 07-10-2014.
O aumento de militares, religiosos, ruralistas e outros segmentos mais identificados com o conservadorismo refletem, segundo o diretor do Diap, Antônio Augusto Queiroz, esse novo status. "O novo Congresso é, seguramente, o mais conservador do período pós-1964", afirma. "As pessoas não sabem o que fazem as instituições e se você não tem esse domínio, é trágico", avalia.
Ele acredita que a tensão criada pelo debate de pautas como a legalização do casamento gay e a descriminalização do aborto deve se acirrar no Congresso, agora com menos influência de mediadores tradicionais, que não conseguiram de reeleger. "No caso da Câmara, muitos dos parlamentares que cuidavam da articulação (para evitar tensões) não estarão na próxima legislatura. Algo como 40% da 'elite' do Congresso não estará na próxima legislatura, seja porque não conseguiram se reeleger ou disputaram outros cargos. Houve uma guinada muito grande na direção do conservadorismo", diz.
O levantamento do Diap mostra que o número de deputados ligados a causas sociais caiu, drasticamente, embora os números totais ainda estejam sendo calculados. A proporção da frente sindical também foi reduzida quase à metade: de 83 para 46 parlamentares. Junto com a redução desses grupos, o aborto, o casamento entre pessoas do mesmo sexo e a descriminalização das drogas - temas que permearam os debates no primeiro turno da disputa presidencial - têm poucas chances de serem abordados pelo Congresso eleito, que tomará posse em fevereiro de 2015.
"Posso afirmar com segurança que houve retrocesso em relação a essas pautas. Se no atual Congresso houve dificuldade para que elas prosperassem, no próximo isso será muito mais ampliado. Houve uma redução de quem defendia essa pauta no Parlamento e praticamente dobrou (o número de) quem é contra", diz.
Parte consistente do conservadorismo, segundo Queiroz, virá da bancada evangélica. Ele estima que o número de religiosos desta corrente deve crescer em relação aos 70 deputados eleitos em 2010. "A bancada evangélica vai ficar um pouquinho maior, mas com uma diferença: nomes de maior peso dentro das igrejas para melhor coordenar e articular os interesses desse segmento junto ao Congresso", diz. Entre essas lideranças, o Diap já identificou 40 bispos e pastores.
Militares
Diap também estima um aumento consistente de policiais e militares eleitos. Queiroz prevê que o aumento de parlamentares com este perfil deve chegar a 30%. "Esse grupo, necessariamente, vai fazer parte da 'bancada da bala', porque defende a defesa individual", diz, referindo-se ao lobby da indústria armamentista.
A ampliação desse grupo é uma onda que veio na contramão das manifestações populares de 2013. "Isso é produto da alienação. Quem foi para rua, em grande medida, foi pedindo mudanças. Mas sem ter uma liderança capaz direcionar e coordenar (o movimento). Era 'contra tudo o que está aí'."
Queiroz considera que, caso o candidato do PSDB, Aécio Neves, seja eleito, temas como a redução da maioridade penal, considerada uma proposta conservadora, podem avançar facilmente no Congresso. "O PSDB perdeu em quantidade (reduziu de 12 para 10 o número de senadores), mas é uma bancada que se renova do ponto de vista qualitativo. Só que com viés conservador", diz.
FONTE: IHU