sexta-feira, 14 de abril de 2017

No rosto de Jesus crucificado os rostos da humanidade

Eis aí, Jesus, aquele que assumiu viver a condição de oprimido. E não poderia ser diferente, Ele não poderia ficar com os opressores, pois seria se tornar cúmplice do pecado. Jesus, diante da realidade, não se viu dividido em aceitar ou recusar a dor e o sofrimento. Ele se identificou com o sedento, com o nu, com o faminto, com o doente, com o espoliado e com o encarcerado, para que estes se tornassem aqueles que devem merecer, preferencialmente, o nosso amor.

Jesus assumiu a condição do sacrificado, do violentado e do esmagado. Assumiu solidário a tantas vítimas, não por masoquismo, mas porque esse é o caminho para os que defendem a verdade. E este ainda é o caminho, assim como o foi para Chico Mendes, para o indio Marçal, para Pe Josimo, para a sindicalista Margarida Alves, para irmã Dorothy e para tantas e tantos outros e outras mártires da luta pela terra, trabalho, casa, saúde, pão, liberdade e dignidade.

Morto e já transpassado pela lança, o sol já se punha. Quanto aos apóstolos, companheiros, atordoados e confusos, os Evangelhos nem mencionam a presença deles naquele momento crítico. Só falam da presença de mulheres e do discípulo amado. Jesus estava abandonado. As mulheres, olhavam o inocente supliciado e morto. Elas haviam caminhado com Ele, haviam visto fazer o bem a todos. Naquele instante elas não podiam arrancar o cadáver de Jesus, lavá-lo, embalsamá-lo, nem envolvê-lo em pano e faixas, tudo ao mesmo tempo e sepultá-lo.

Mas ali se encontravam José de Arimatéia e Nicodémos. José de Arimatéia homem bom e justo, como atesta o evangelho, era membro do Sinédrio, e cedeu sua tumba para sepultar Jesus, num horto, sob o Golgota. Nicodemos era fariseu, que um dia teve coragem de defender Jesus diante do Sinédrio. Dois discípulos ocultos do mestre. Na vida a solidariedade pode vir de onde menos se espera. Pilatos deixou que eles retirassem Jesus da cruz.

A presença das mulheres e de João, juntos ao pé da cruz, na execução de Jesus, e as atitudes de José de Arimatéia e Nicodemos, expressam risco de uma perigosa decisão. No ato de estar solidário e não abandonar, e no ato de dar sepultura para um homem condenado e odiado pelas autoridades, está o testemunho que atesta a derrota do medo.

Nesta sexta feira santa contemplamos em Cristo o rosto sofrido, do cotidiano da humanidade. O rosto das crianças condenadas a morrerem pobres, crianças que aparentam oito anos, quando de fato tem treze. O rosto das mulheres subjugadas peleo patriarcalismo, que ainda impera em nossa sociedade. 

O teu rosto sofredor, Senhor, está nos rostos dos índios e dos negros descriminados. Senhor, teu rosto está no rosto sofrido dos operários mal pagos, nos favelados, sem terra, sem teto, subempregados e desempregados, nos jovens desorientados e nos LGBTs marginalizados e agredidos em sua dignidade. Senhor, teu rosto está na natureza destruída e manipulada pelo capital. 

Fazer memória viva da paixão de Jesus Cristo é assumir, no dia-a-dia da vida, a luta pela libertação, redenção dos rostos da humanidade.
Frei Rodrigo Péret, ofm

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