quinta-feira, 21 de julho de 2016

Bairro Elisson Prieto: direito à vida e não a lógica do mercado imobiliário

da página do CORREIO
Edilson José Graciolli
Professor do Instituto de Ciências Sociais da
Universidade Federal de Uberlândi - UFU
 
Gestores da UFU (os atuais reitor e vice-reitor, professores Elmiro Santos Resende e Eduardo Nunes Guimarães, e o ex-reitor, professor Alfredo Júlio Fernandes Neto) são alvos de uma ação civil pública proposta pelo Ministério Público Federal (MPF) e acolhida pelo juiz da Segunda Vara Federal, José Humberto Ferreira, relativamente ao que, na visão desses agentes do sistema estatal, teria causado danos ao tesouro nacional, dado que esses gestores da UFU não teriam entrado com uma ação de reintegração de posse quanto à área ocupada em 2012 e que se denomina bairro Elisson Prieto.
 
Essa ocupação constitui a luta por moradia realizada por 2.350 famílias de trabalhadores sem-teto, o que significa quase 15 mil pessoas, em uma propriedade da UFU.
 
O conflito tem sido objeto de negociação entre a própria UFU, a Prefeitura de Uberlândia e o Governo Federal e vem encontrando uma adequada solução nessas esferas, à luz do que estabelece a Constituição Federal, na qual se exige que a propriedade do solo se vincule à função social, de um lado, e, de outro, da própria definição de moradia como um direito humano essencial (estabelecido em termos de segurança da posse, disponibilidade de estrutura e serviços públicos, habitabilidade, custo acessível, priorização de populações vulneráveis, não discriminação, localização adequada e adequação cultural).
 
No que diz respeito à UFU, o acordo, já aprovado pelo seu Conselho Universitário – órgão deliberativo máximo –, prevê a troca dessa parcela da fazenda do Glória por uma área no Capim Branco (do Governo Federal), permuta fundamentada em laudos produzidos pela Companhia de Habitação de Minas Gerais (Cohab/MG) e homologados pela Secretaria de Patrimônio da União (SPU). No laudo 136/2015 da SPU o valor da área que a UFU receberia (no Capim Branco) é estimado em R$ 44.300.000,00, ao passo que o laudo 137/2015 da SPU estipula em R$ 45.400.000,00. Registre-se que a Constituição Federal prevê, em seu artigo 207, que a autonomia universitária inclui as dimensões administrativas e de gestão financeira e patrimonial.
 
Em outras palavras, a negociação mencionada leva em consideração, como valor maior, o direito à vida, e não a lógica do mercado imobiliário. Qual é, afinal de contas e das contas, a melhor função social que pode cumprir essa área do bairro Elisson Prieto? Por todos os motivos, há de se reconhecer que a melhor utilização é a regularização plena das moradias hoje construídas e que abrigam tais pessoas.
 
A própria Polícia Militar prevê que uma eventual ação de reintegração de posse custará algo próximo a R$ 7,5 milhões e tenderá a apresentar um saldo de 40 mortes, sendo 10 PMs e 30 dentre os ocupantes.
 
Não obstante todos esses argumentos e dados, o MPF, agora com o endosso da Segunda Vara da Justiça Federal, insiste em criminalizar a ocupação e os gestores da UFU que têm atuado em consonância com o bom senso, com o que o Conselho Universitário aprovou, com a função social da propriedade, com a Declaração Universal dos Direitos Humanos e com o princípio da justiça social.
 
Em síntese, a ação civil pública do MPF se pauta por uma linha de atuação que instiga o confronto, tudo em nome de um suposto prejuízo ao tesouro nacional. O direito coletivo, aí sim, que está sob risco é o da moradia, como parte constitutiva do direito maior, o da vida.
 
Não me parece ser esse o melhor caminho. Por isso, repudio a presente ação do MPF e seu acatamento pela Justiça.
 
Por isso me solidarizo com os gestores da UFU que tiveram seus bens indisponibilizados, entre outras sanções, em virtude, no limite, de terem agido em conformidade com tudo o que se disse acima.
 
Por isso, enfim, defendo a finalização da negociação entre UFU, Prefeitura de Uberlândia e Governo Federal, produzindo-se, assim, todos os desdobramentos que regularizem o bairro Elisson Prieto, num gesto pedagógico e político de que a terra é um bem a que todos devem ter acesso e que não deve servir à função de estoque de valor, seja para interesses imediatamente privados, seja para aqueles mediados pela propriedade estatal.
FONTE: CORREIO DE UBERLÂNDIA
 
 
 

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